Desde a aprovação de leis que tratam da transição energética justa, a cadeia produtiva do carvão viu poucos avanços acontecerem no estado

Em janeiro de 2022, em Brasília, o então presidente da República Jair Bolsonaro sancionou a criação do programa de transição energética justa para promover a transição observando os impactos ambientais, econômicos e sociais com a valorização dos recursos energéticos e minerais alinhada à neutralidade de carbono. E assim, preparar a região carbonífera de Santa Catarina para o provável encerramento das atividades até 2040.

Por aqui, no mesmo dia, a Assembleia Legislativa de Santa Catarina instituiu a política estadual de transição energética justa para promover o desenvolvimento sustentável das cadeias produtivas catarinenses. O deputado federal Ricardo Guidi (PL), que participou das discussões no âmbito federal, vê como fundamental a aprovação de uma legislação para o processo.

“Como autor do texto da lei que trata da transição energética justa do carvão mineral catarinense posso garantir que ela é fundamental para o Sul catarinense, pois garante a manutenção de uma economia que representa 15% do PIB da região. São mais de 20 mil empregos diretos e indiretos. É fundamental para o Brasil porque garante segurança energética de fornecimento de energia elétrica também para o nosso país”, destaca.

Mas, de lá para cá, o processo de transição energética caminhava a passos lentos. Nesta semana, teve fim a consulta pública aberta pelo Ministério de Minas e Energia sobre a proposta do contrato de energia reserva da termelétrica Jorge Lacerda que opera em Capivari de Baixo. Um passo importante, pois o documento traz vários pontos com relação às ações ligadas diretamente à produção de energia e transição energética. As contribuições recebidas ajudarão a nortear as decisões.

O embaixador brasileiro Rubem Barbosa, que já esteve à frente da embaixada brasileira em Washington e Londres, contribuiu com a consulta pública. Ele se manifestou contrário, por exemplo, à clausula que impede a exportação de energia pelo complexo termelétrico Jorge Lacerda para a Argentina.

“Eu procurei mostrar a política de vários modelos que vem desde o governo Fernando Henrique e que foi mantida pelo governo Lula de integração energética. Se houver excedente de energia, não necessária naquele momento para o mercado interno brasileiro, não há razão para ter essa proibição, porque isso contraria dispositivos da Constituição e uma série de acordos que eu procurei mostrar sobre a integração energética com o Uruguai e a Argentina. Isso, se for mantido, contraria compromissos internacionais assinado pelo governo brasileiro”, explica.

Alternativas
O complexo Jorge Lacerda é um importante ator na integração energética do Brasil com a Argentina e o Uruguai, especialmente nos últimos três anos. A exportação de energia para estes países representa uma destinação adequada de uma energia que o Brasil não necessitou nestes anos. Em contrapartida, nas últimas semanas, a Argentina exportou energia para o Brasil, quando vimos a Aneel decretar a bandeira tarifária vermelha. Além disso, o complexo termelétrico Jorge Lacerda tem contribuído com a segurança energética do país.

No momento em que o Operador Nacional do Sistema elétrico viu uma escassez histórica do recurso hídrico, convocou o acionamento da usina para evitar desabastecimento. Xisto Vieira, presidente da Abraget (Associação Brasileira de Geradoras Termelétricas), lembra que foi, também, durante as enchentes no Rio Grande do Sul, que as térmicas tiveram um papel fundamental no fornecimento de energia.

“Todas essas emergências têm sido suportadas principalmente pelas termelétricas. A gente pode ver nesse problema no Rio Grande do Sul. A usina termelétrica de Canoas e a própria usina Jorge Lacerda, todas as usinas térmicas a carvão, contribuíram fortemente para manter a confiabilidade mesmo com aquele nível de emergência. É muito difícil hoje, mesmo com tecnologia, substituir geração termoelétrica e hidrelétrica que são compostas de maquinas síncronas e aderentes diretamente ao sistema elétrico, não intermitentes e despacháveis”, afirma Vieira.

Milhares de empregos na cadeia produtiva
O funcionamento do maior complexo termelétrico da América do Sul, segundo estudo feito pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) impacta cerca de 100 mil pessoas, com média de 20 mil empregos diretos e indiretos. Movimenta cerca de R$ 6 bilhões no ano. O presidente da Federação dos Mineiros, Genoir dos Santos, ressalta a importância do setor para a economia de 15 cidades catarinenses e para o PIB da região Sul. Uma cadeia responsável por uma fatia de cerca de 15%.

“Há um estudo da Fundação Getúlio Vargas que diz que a cada um emprego direto na mineração temos reflexo de mais 8,32 empregos indiretos, então, estamos falando de mais de 20 mil trabalhadores, e para conseguir emprego de qualidade, emprego que remunera, que paga todas as suas obrigações de encargos sociais e movimenta a economia dos municípios, não é de um dia para o outro. Então, há necessidade da comissão que vai discutir a transição energética justa ver o que podemos apontar como indicativos para resolver o problema dos trabalhadores, mas também dos municípios, porque muitos deles são dependentes da movimentação econômica do carvão”, pontua.

A pesquisa do Dieese sobre os impactos do encerramento das atividades ligadas à extração de carvão da região Sul aponta, ainda, que caso houvesse o encerramento das atividades, sobretudo a geração termelétrica, seriam eliminados mais de 36 mil empregos, reduzindo em R$ 4,3 bilhões o valor adicionado do país, R$ 1,6 bilhão a menos na arrecadação de impostos, com queda de R$ 1,1 bilhão na massa salarial e de R$ 292 milhões na arrecadação da Previdência e FGTS.

Descarbonização
O senador Espiridião Amin (PP) lembra que pesquisas já estão sendo feitas em Santa Catarina para a descarbonização do carvão. Estudos que poderão ajudar a nortear as mudanças na cadeia do carvão de forma justa.

“Santa Catarina não quer um favor, quer que seja possível pesquisar com inteligência termos uma transição energética justa. Queremos que o carvão também possa ser uma fonte de transição, mas como? Estamos estudando, por isso queremos ter o tempo de transição para que o carvão seja menos poluente, e já é menos poluente, e possa receber benefícios financeiros que estimulem a pesquisa. O que não queremos é ser proscrito, olha vocês não existem mais. A transição energética no mundo tem o prazo de 2050, aqui colocamos na lei 2040. Estamos pedindo um prazo menor do que o mundo se deu”, explica.

Fonte: Karina Koppe – NDmais
Imagem: Reprodução/ND